sexta-feira, 19 de junho de 2009

TED: A Perda da Sabedoria - Barry Schwartz



Link do Vídeo - Legendado em Português

Posto aqui um resumo da transcrição de outra palestra do Barry Schwartz, no TED, sobre moralidade e sabedoria. Regras e incentivos podem nos limitar ou nos corromper, afetando nossa preocupação com a inovação ou com o que é certo. Devemos ter sabedoria prática, saber quando e como abrir exceções para fazer o que é certo, do jeito certo pelas razões certas. Ensinar nossos filhos a ter caráter, respeito por si, pelos outros e pelo ato de aprender, deve ser o maior objetivo. Vamos celebrar os exemplos de moralidade e auxiliar, a nós e aos outros, a criar sabedoria em vez de suprimi-la.

Lição de Sabedoria dos Faxineiros
"Na descrição de trabalho de um faxineiro no hospital, todos os itens, como limpar o chão, varrer, colocar estoques de produtos nos armários, são normais. Mesmo sendo uma lista muito longa, surpreendentemente não há nela um único item que envolva outros seres humanos. Nem um único. O trabalho do faxineiro poderia muito bem estar sendo feito num necrotério ao invés de num hospital. Quando os psicólogos entrevistaram os faxineiros do hospital, encontraram Mike, que contou como parou de limpar o chão porque o Sr. Jones estava fora da cama se exercitanto, tentando ficar mais forte caminhando lentamente pelo corredor. E Charlene, que ignorou a recomendação de seu supervisor e não passou aspirador na sala de visitantes porque havia familiares de paceientes que estavam no hospital todos os dias durante todo o dia e que, neste momento, estavam lá tirando uma soneca. O comportamento destes faxineiros não só faz as pessoas se sentirem um pouco melhor, mas na verdade melhora a qualidade do cuidado dos pacientes e faz com que os hospitais funcionem bem.

Os faxineiros que são assim sabem que todas estas formas de interação humana, envolvendo gentileza, cuidado e empatia, são partes essenciais do trabalho mesmo sem que haja uma só palavra na sua descrição de trabalho sobre outros seres humanos. Estes faxineiros têm a vontade moral de fazer o que é certo pelas outras pessoas e, além disso, têm a habilidade moral de perceber o que "fazer o que é certo" significa.

Aristóteles disse que "sabedoria prática é a combinação de vontade moral e habilidade moral". Uma pessoa sábia percebe quando e como abrir uma exceção a cada regra, como os faxineiros sabiam quando ignorar os deveres do trabalho em função de outros objetivos. Uma pessoa sábia sabe como improvisar, como um músico de jazz usando as notas musicais de uma página mas dançando ao redor delas, inventando combinações apropriadas para a situação e as pessoas à sua volta. Uma pessoa sábia sabe como usar habilidades morais a serviço dos objetivos corretos, para servir outras pessoas e não para manipular. E, talvez o mais importante, uma pessoa sábia é criada, não nasce pronta. Você precisa ter tempo para conhecer as pessoas que você está servindo, ter permissão para improvisar, tentar coisas novas, falhar ocasionalmente e aprender com suas falhas. E você precisa ser monitorado por mentores sábios. Não é necessário ser brilhante para ser sábio, mas sem sabedoria, brilhantismo não é suficiente."

Regras
Um pai e seu filho de 7 anos assistiam um jogo no estádio quando o filho pediu uma limonada. No quiosque só tinham a "Limonada Forte do Mike". O pai, professor da Universidade, não fazia a menor idéia que a "Limonada Forte do Mike" tinha 5% álcool. Quando um guarda viu o garoto tomando-a, chamou a polícia, que chamou a ambulância, que carregou o menino até o hospital. Na sala de emergência constatou-se que o garoto não tinha álcool no sangue e o garoto poderia ser liberado. Mas não tão rápido. O Serviço de Proteção ao Bem-Estar Infantil disse "não" e a criança foi enviada a uma família que acolhe crianças com problemas por 3 dias. Após esse tempo, o juiz disse que a criança poderia ir para casa mas somente se o pai deixasse a casa e fosse para um hotel. Após 2 semanas a família foi reunida, mas os assistentes sociais, o pessoal da ambulância e o juiz todos disseram a mesma coisa: "Nós detestamos fazer estas coisas, mas precisamos seguir as regras".

Scott Simon, que contou esta história na NPR, disse " regras podem ser idiotas, mas elas te poupam do trabalho de pensar". As regras são com frequência impostas porque pessoas foram pouco cuidadosas antes e deixaram crianças voltarem a um lar onde eram maltratadas. Quando as coisas vão mal, buscamos 2 intrumentos para consertá-las.

  1. Regras - regras melhores, mais regras
  2. Incentivos - incentivos melhores e em maior número
    O que acontece quando nós nos voltamos mais para as regras, é que regras e incentivos podem melhorar as coisas a curto prazo, mas acabam criando uma espiral descendente, que torna as coisas piores a longo prazo. A habilidade moral acaba sendo desgastada pela confiança excessiva em regras que nos privam da oportunidade de improvisar e aprender com nossas improvisações. E aí a vontade moral é minada por um apelo incessante a incentivos que destroem a nossa vontade de fazer as coisas corretamente.
Um outro exemplo de guerra contra as habilidades morais é a natureza da educação americana moderna: Currículo escolar seguindo roteiros rígidos. Em toda Chicago, em todo jardim de infância da cidade, todos os professores estão dizendo as mesmas palavras, da mesma maneira, no mesmo dia. Nós sabemos por que estes roteiros estão lá. Nós não confiamos suficientemente na capacidade de julgamento dos professores para deixá-los ensinando por si próprios. Roteiros como este são uma espécie de "seguro" contra desastres, e eles impedem desastres. Mas o que asseguram, ao invés do desastre, é mediocridade. Nós precisamos de regras! Mas regras em excesso impedem que músicos de jazz talentosos improvisem. E, como resultado, eles perdem o seu talento, ou pior ainda, param completamente de tocar.

Incentivos
Se você tem uma razão para fazer algo, e eu lhe dou uma segunda razão para fazer a mesma coisa, parece lógico que duas razões são melhor que uma e você tem mais probabilidade de fazer a tal coisa. Porém, algumas vezes as duas razões para fazer a mesma coisa parecem competir entre elas, ao invés de se complementarem, e tornam menos provável que as pessoas façam a coisa. Na Suíça, há cerca de 15 anos atrás, estavam tentando decidir aonde colocar os depósitos de lixo nuclear. Alguns psicólogos fizeram perguntas para cidadãos bem informados em diferentes áreas do País. Eles perguntaram, "você aceita ter um deposito de lixo nuclear na sua comunidade?" Surpreendentemente, 50% dos cidadãos disseram que sim. Eles sabiam que era perigoso, que iria diminuir o valor das suas moradias, mas o lixo tinha que ir para algum lugar e eles tinham responsabilidades, enquanto cidadãos. Os psicólogos perguntaram a outras pessoas uma questão ligeiramente diferente: "se nós pagarmos 6 semanas de salário por ano à você, você aceitaria ter um deposito de lixo nuclear na sua comunidade?" Duas razões. É minha responsabilidade e estou sendo pago. Ao invés de 50% dizendo que sim, 25% disseram que sim. No segundo em que a introdução de um incentivo chega a nós, ao invés de perguntarmos, "qual é a minha responsabilidade?", tudo que nós perguntamos é "o que serve a meus interesses?" Quando incentivos não funcionam, quando presidentes de empresas ignoram a saúde a longo prazo das suas companhias, perseguindo ganhos de curto prazo que levarão ao ganho de bônus enormes, a resposta é sempre a mesma. Consiga incentivos mais espertos. A verdade é que não há incentivos que serão sempre suficientemente espertos. Todo sistema de incentivos pode ser subvertido pela má fé. Nós necessitamos de incentivos. As pessoas precisam ganhar a vida. Mas confiança excessiva em incentivos desmoraliza qualquer atividade profissional, nos dois sentidos do termo. Faz com que as pessoas engajadas na atividade percam o moral, e causa a perda da moralidade da própria atividade.

Barack Obama disse, antes de sua posse, "Nós temos que perguntar não somente: 'isto vai trazer lucro?', mas também 'isto é correto'?" E quando profissões são desmoralizadas todo mundo que trabalha nelas fica viciado em incentivos, e eles param de perguntar: “isto é correto?" É obvio que esta não é a maneira pela qual as pessoas querem trabalhar.

O que podemos fazer?
Algumas fontes de esperança: Nós temos que tentar "re-moralizar" o trabalho. Uma maneira de não fazer isto: mais cursos de ética. Não há maneira melhor de mostrar às pessoas que você não é sério do que juntar tudo o que você quer dizer sobre ética num pacotinho com um laço de fita, e consigná-lo às margens de um curso de ética.

Ao invés disto? Um: celebrar exemplos de moralidade. Pessoas se inspiram com heróis morais. Mas nós aprendemos que, com sofisticação intelectual vem o entendimento de que nos não podemos admitir que temos heróis morais. Bom, admitamos eles, então. Fiquemos orgulhosos de tê-los. Comemoremos eles. E exijamos que pessoas que ensinam os admitam e os comemorem também. Isto é a coisa mais importante que podemos fazer. Aaron Feuerstein, que manteve seus funcionários na folha de pagamento mesmo após um incêncio, Ray Anderson, que transformou uma parte de um Império do Mal num negocio de emissão quase neutra de carbono, Willie Smits, que, de várias maneiras, é o exemplo perfeito, todos eles são exemplos de um herói moral. Portanto, há muitas coisas aqui no TED, e em outros lugares, para comemorarmos. E não é necessário ser um mega-herói. Ha heróis comuns. Heróis comuns, como os faxineiros, que devemos comemorar também. Como profissionais, cada um de nós deve fazer um esforço para ser um herói comum, ou se possível, fora do comum. Como chefes de organizações, nos esforçamos para criar meio-ambientes que encorajam e nutrem as habilidades morais e a determinação moral. Mesmo as pessoas mais sábias e melhor intencionadas desistem, se elas têm que nadar contra a corrente nas organizações onde elas trabalham. A verdade é que qualquer trabalho que envolve interação com outras pessoas é um trabalho moral. E qualquer trabalho moral depende de sabedora prática.

E, talvez mais importante, como professores, nós devemos nos esforçar para ser heróis comuns, exemplos morais para as pessoas das quais somos mentores. Bill Gates falou sobre a importância da educação e, em particular, do modelo que a KIPP esta nos dando, "Conhecimento é poder", pegando garotos de áreas desfavorecidas e direcioná-los para uma Universidade. Eles perceberam que a coisa mais importante que os garotos precisam aprender é caráter. Eles precisam aprender a respeitar a si próprios. Eles precisam aprender a respeitar os seus colegas de escola. Precisam aprender a respeitar seus professores. E mais importante que tudo, precisam aprender a respeitar o ato de aprender. Este é o principal objetivo. Se você faz isto, as outras coisas fluem com facilidade. E aos professores: a maneira como vocês ensinam estas coisas aos garotos é ter professores e membros da equipe encarnando isto a cada minuto de cada dia.

A virtude que eu acho que precisamos, acima de todas, é sabedoria prática, pois é a que permite que todas as outras virtudes - honestidade, gentileza, coragem - sejam mostradas no momento certo e da maneira certa. Eu acho que há razão para se ter esperança. Eu acho que as pessoas querem ser virtuosas.

De várias formas, esta é a razão principal da TED. Querer fazer as coisas que são certas, da maneira certa, pelas razões certas. Este tipo de sabedoria está ao alcance de cada um de nós, basta que comecemos a prestar atenção. Prestar atenção ao que fazemos, e como o fazemos, e, talvez mais importante, à estrutura das organizações para as quais trabalhamos, para ter certeza que elas nos auxiliam, e às outras pessoas, a desenvolver sabedoria, ao invés de suprimi-la.

Resumindo
- Uma pessoa sábia percebe quando e como abrir uma exceção a cada regra
- Uma pessoa sábia sabe como improvisar
- Uma pessoa sábia sabe como usar habilidades morais a serviço dos objetivos corretos, para servir outras pessoas e não para manipular
- Uma pessoa sábia é criada, não nasce pronta
- Não é necessário ser brilhante para ser sábio, mas sem sabedoria, brilhantismo não é suficiente
- Regras podem ser idiotas, mas elas te poupam do trabalho de pensar
- Regras e incentivos podem melhorar as coisas a curto prazo, mas acabam criando uma espiral descendente, que torna as coisas piores a longo prazo. A habilidade moral acaba sendo desgastada pela confiança excessiva em regras que nos privam da oportunidade de improvisar e aprender com nossas improvisações. E aí a vontade moral é minada por um apelo incessante a incentivos que destroem a nossa vontade de fazer as coisas corretamente
- O que regras asseguram, ao invés do desastre, é mediocridade
- A coisa mais importante que os garotos precisam aprender é caráter. Eles precisam aprender a respeitar a si próprios, os seus colegas de escola, seus professores. E mais importante que tudo, precisam aprender a respeitar o ato de aprender. Este é o principal objetivo.
- Fazer as coisas que são certas, da maneira certa, pelas razões certas e ter certeza que elas nos auxiliam, e às outras pessoas, a desenvolver sabedoria, ao invés de suprimi-la

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