sábado, 2 de julho de 2011

HBR - Repensando o Capitalismo


Posto aqui um resumo das ideias apresentadas por Michael Porter na entrevista em vídeo Rethinking Capitalism feita pela Harvard Business Review em 5 de janeiro. Os trabalhos de Porter, como "As Cinco Forças Competitivas que Formam a Estratégia", revolucionaram o assunto Estratégia e nesta entrevista ele apresenta uma evolução do capitalismo para atender as demandas da sociedade.

Segundo ele, os negócios evoluiram no escopo estreito de como criar valor econômico e as empresas acabam sendo vistas como criadoras de lucro ao custo das comunidades em vez de criar valor que acima de tudo beneficie as comunidades. Desta forma, os governos passaram a ver negócios como problemas, fontes de coisas ruins alimentando um modelo mental com cada vez mais regulação, controle e impostos, satisfazendo uma opinião pública que surge dessa percepção dos negócios.

Nos últimos anos a visão de relacionamento entre negócios e sociedade foi marcada pela ideia de que a maximização de lucros era benéfica à sociedade por gerar mais empregos e, assim, inclusão social, de forma que o que é bom para os negócios é naturalmente bom para a sociedade. No entanto, há áreas, como saude, nutrição e a crise hipotecária, em que a relação entre maximização de lucro e as demandas da sociedade se tornaram mais complicadas.

Ainda que o lucro não seja fundamentalmente inconsistente com as necessidades da sociedade, se as empresas enxergarem o lucro em uma perspectiva estreita, não pensarem de forma mais abrangente e de longo prazo e não entenderem as influências mais amplas na sustentabilidade do seu sucesso, poderão cair na situação de um lucro que vem ao custo das necessidades sociais. Dessa forma, as pessoas podem não gostar destas empresas, em uma situação em que há lucro porém não há contratações, há demissões, fornecedores locais saem do negócio e poluição.

A premissa de que é o que é bom para os negócios é bom para a sociedade deve ser mudada para o que é bom para a sociedade é bom para os negócios. Parece apenas um jogo de palavras, mas é uma grande mudança de pensamento. A nova frase diz que criar benefício social é uma forma poderosa de criar valor econômico para a empresa. Por não pensarem dessa forma, muitas empresas perdem grandes oportunidades de lucro do jeito certo que na realidade surgem de atender necessidades sociais humanas. Pensando no meio ambiente, por exemplo, pode surgir simplesmente por alguém querer ser uma boa pessoa. No entanto, muitas empresas, hoje, economizam milhões em dinheiro, eliminando logística desnecessária ou usando menos energia, por exemplo. Outras empresas criam produtos que não lidam apenas com necessidades básicas, que não forçam produtos aos consumidores, mas sim produzem produtos que são de verdade bons para os consumidores, que são nutricionais, saudaveis, auxiliam-nos a economizar e criar sua família. Essa é a forma certa de criar lucro.

Uma das premissas do conceito de valor compartilhado (Shared Value) é que nós maximizamos a satisfação de necessidades convencionais das últimas décadas, porém nós temos vastas necessidades sociais, nos paises em desenvolvimento ou nos desenvolvidos, como em questões de saude, habitação, e nós podemos mobilizar o capitalismo para resolver estas questões e podemos ganhar muito dinheiro fazendo isso. O lucro nesse contexto deve vir de valor compartilhado, não ao custo das comunidades.

Porter se deu conta desse conceito quando estudou qual a importância da localização das empresas, o que foi crítico para ver as sinergias e relações entre os negócios e a sociedade. Nesse sentido, no próximo capítulo do pensamento sobre estratégia, sobre configuração de cadeias de valor e criação de vantagens estratégicas, as dimensões de valor compartilhado da estratégia de uma empresa, que envolvem os impactos sociais e as necessidades importantes da sociedade, vão ser os maiores diferenciais que as empresas poderão mobilizar.

Um exemplo é a empresa Whole Foods, que criuou um enorme sucesso econômico utilizando o conceito de valor compartilhado. Na opinião de Porter, a estratégia das empresas que obterão vantagens competitivas sustentáveis não vai ser baseada em pequenas diferenças e equilíbrios entre custo e qualidade, mas engajarão comunidades nunca atendidas e considerarão as necessidades humanas fundamentais relacionadas aos produtos.

Será que é possível escolher entre lucro e comunidade? Porter diz que há muitas coisas que as empresas podem fazer que não envolvem esse trade-off entre comunidade e lucro. E é nessas ações que as empresas devem focar. Nesse sentido, para construir valor compartilhando pensando além dessa perspectiva, não dê dinheiro em causas sociais aleatórias simplesmente para construir uma reputação. Em vez disso, compreenda bem o que é o seu produto, com é a sua cadeia de valor e entenda onde eles tocam importantes necessidades da sociedade. Se você é uma empresa de alimentos, pense em nutrição, se a sua empresa tem um produto que utiliza muita energia, pense no uso de energia do produto, se a sua empresa está no setor financeiro, pense em poupança, financiamento ou a compra de casa própria, mas de uma forma que realmente seja boa para o consumidor, não apenas uma iniciativa cínica para forçá-los a adquirir uma hipoteca que eles não vão conseguir pagar. Então, há muitas oportunidades em produtos, cadeias de valor e clusters de várias organizações.

Um exemplo é o fair trade, que visa distribuir melhor os preços entre produção e logística para que os agricultores possam receber mais. Essa é uma ideia clássica da de Responsabilidade Social Corporativa, em que há uma torta fixa, ou seja, uma quantidade de riqueza fixa e foca-se na redistribuição e no fazer com que as pessoas se sintam boas, por serem justas. No valor compartilhado, a verdadeira oportunidade é aumentar a torta pensando em como criar mais valor e, assim, o agricultor vai ser recompensado por participar na criação de mais valor do qual todos são beneficiados. Nessa linha, as empresas estão aprendendo que treinar os agricultores para melhorar o plantio, melhorar o acesso a fertilizantes, sementes ou melhorar o sistema de logística resulta em mais produtividade por hectare, aumento de qualidade e consequentemente aumento do preço, já que as pessoas vão pagar mais por um produto de maior qualidade, o que faz com que o aumento da renda do agricultor vá de 20% para 200%. Isso não é caridade, é aumentar a torda, criando valor econômico e valor social.

A maior objeção para a RSC é por que uma pessoa com seus valores pessoais vai investir o dinheiro do acionista em uma causa e não outra? O valor compartilhado é de interesse da própria empresa, que irá, por exemplo, comprar o café de uma forma diferente. Nesse sentido é ainda a mão invisível e não o uso do dinheiro do acionista.

Há excelentes empresas liderando esse movimento. Os chefes de RSC estão percebendo que a RSC pode estar em uma fase terminal e que nós devemos avançar. O verdadeiro impacto não está na RSC ou na doação por caridades, mas sim em mobilizar o negócio em si. A boa notícia é que isso não é algo que ainda não está sendo realizado no mundo, há muitas empresas que já estão trabalhando nesse sentido como a Nestlé, Unilever e GE. Haverá um período fascinante à frente. Não vamos apenar fazer o bem para a sociedade, mas vamos acabar reconfigurando a cadeia de valor, repensando a localização das coisas, as relações com fornecedores e desenvolver produtos de uma forma diferente. E os benefícios que vão muito além do que podemos imaginar hoje.