domingo, 29 de março de 2009

Teoria das Redes

Vou postar aqui um pequeno resumo das minhas anotações em uma palestra muito interessante do Augusto de Franco, realizada no INTEGRA 2009. Ele fala de um novo modelo de trabalho e cooperação, o modelo de redes. Embora inicialmente utilizada para comunicação, o modelo de redes pode ser aproveitado em qualquer área mostrando uma nova forma de organização, mais sustentável e produtiva. Este modelo está em evidência e rápido crescimento principalmente pela evolução das tecnologias de comunicação e colaboração, em que pessoas conhecidas se unem para a realização de um objetivo comum sem um comando central ou obrigação. Exemplos são o linux e o desenvolvimento open-source, além de revitalizações de bairros pela própria comunidade, manifestações políticas, entre outras.

Os estudos de redes foram iniciados por Paul Baran, a pedido do governo americano. Uma rede pode ser definida por múltiplos caminhos, nós e conexões. Desta forma, se podemos falar com o presidente de uma organização somente falando antes com a secretária, há então somente um caminho. Se podemos falar com a secretária mas também diretamente com o presidente, temos uma pequena rede, já que não há mais somente um caminho. Quanto ao nível de centralização (mais informações aqui), uma rede centralizada é aquela que depende de um nó central. Se este nó cai, a rede também cai. Uma rede descentralizada é aquela que possui mais de um nó central. Se um dos nós centrais cai, somente uma parte da rede também cai. Já as distribuídas são aquelas que não possuem nó central. A rede continua operando normalmente sem aquele nó. Segundo esse modelo de redes, não é o conteúdo da informação o mais importante, mas a forma de conexão. Da mesma forma, equipes podem ser mais produtivas se estimuladas a cooperar em rede, ao invés de apenas receberem ordens. Ou seja, são as mesmas pessoas, porém organizadas de forma diferente. A partir de um número de conexões em relação ao número de nós, ocorrem fenômenos que não dependem do conteúdo.

Esses fenômenos são estudados pela Ciência das Redes e se dividem basicamente em cinco: Clustering, Swarming, Crunch, Auto Regulação Sistêmica e Produção Bottom Up.
- O Clustering seria a consolidação ou nucleação de uma rede, um grupo criativo que é mais do que a soma de pessoas, e tem relação com a tendência de dois conhecidos terem um terceiro conhecido em comum.
- O Swarming, ou enxameamento, é a propagação e aglutinação como enxames de insetos, que, inicialmente dispersos, rapidamente se aglomeram em determinado ponto.
- O Crunch é a redução do tamanho do mundo tornando-o mais potente devido às conexões: diminuem-se as distâncias e aumentam-se as conexões. Em 1967, Milgram pediu que pessoas enviassem 160 cartas de Omaha a um corretor Boston que não conheciam, repassando as cartas somente por meio de conhecidos. Milgram percebeu que, em média, as cartas passavam por 5,5 pessoas antes de chegar ao destino correto. Duncan Watts obteve resultados semelhantes em 2002, de que toda pessoa poderia se conectar a outra no mundo todo por meio de 5 ou 6 conhecidos, de onde deve ter surgido a idéia de que qualquer pessoa no mundo está a 7 pessoas do presidente dos Estados Unidos.
- A Produção Bottom-Up, ou emergente, é a característica de a rede produzir espontaneamente, sem possuir um dono ou líder. Jane Jacob mostrou a capacidade dos laços fracos, em que happy hours, amizades sem finalidades e as atividades na calçada seriam extremament produtivas.
- Por fim, o fenômeno da Auto Regulação mostra que a rede não possui um líder, mas multi-líderes, que se revezam conforme a situação. Uma dinâmica exemplificada foi a de 200 pessoas reunidas numa sala cada uma com um manche. As pessoas deveriam pousar uma aeronave, que responderia aos comandos de todos os manches. A aeronave pousava, ou seja, não havia um comando mas as pessoas se organizavam automaticamente para cumprir o objetivo agindo espontaneamente sem um líder.

Quanto maior o número de conexões, mais sustentável a rede é. Esta idéia vai ao encontro da idéia de modelo de negócios do FNQ, no qual uma empresa tem mais chances de sucesso se estiver em contato com várias entidades de uma rede, o que vai muito além de clientes e fornecedores, incluindo ONGs, escolas, centros de pesquisa, associações profissionais entre outros.

As redes, ainda, extrapolam o networking para o netweaving (informações sobre netweaving aqui). Enquanto o networking tem uma abordagem básica de encontrar pessoas e buscar benefícios para alguém, o netweaving se baseia na genuína vontade em ouvir e aprender ao máximo para tentar ajudar os outros, de forma mais recíproca, natural e humana. Duas idéias, ainda, devem ser lembradas sempre em uma rede verdadeira: conectar pessoas e não instituições hierárquicas; e conectar pessoas entre si, e não por centros articuladores.

São 4 as principais tentações que podem reduzir o potencial ou até destruir uma rede:
- Tratar uma rede como instituição;
- Reunião para discutir o que os outros devem fazer, em vez de simplesmente fazerem. Uma reunião acaba com o senso de ordenação e espontaneidade da rede, é um confinamento. Em uma rede, ninguém possui o poder de comandar ou vetar, ou seja, as pessoas fazem o que acharem melhor em prol do objetivo da rede. Além disso, o voto, que às vezes é usado para tomada de decisões em uma reunião, cria escassez, limita as pessoas e cria tendência, além de revolta para os que perderam o voto. A vontade da rede pode não ser a vontade da maioria;
- Tratar pessoas como "massa" a ser mobilizada, ao invés de amigos a serem conquistados. Uma rede é baseada em P2P, ponto a ponto, as pessoas se comunicam com confiança, entre conhecidos. Não há espaço para panfletagem;
- Monopolizar a liderança, na idéia de que o líder é líder em todo lugar, na empresa, na escola, em casa, não respeitando a multi-liderança.

As redes se fazem e refazem, não crescem indefinidamente e tendem a diminuir no longo prazo. Redes são móveis, não são um instrumento mas sim uma liberdade para o que já exista, para a inteligência. Uma rede só começa com outra rede, já existente, e não nasce a partir de uma hierarquia. No Japão, uma tentativa para a inovação foi integrar várias empresas de vários segmentos, como bancos, montadoras, material escolar, entretenimento, etc. nos chamados Keiretsu. No entanto, a inovação acabou sendo menor do que a do Vale do Silício. Fukuyama explicou a razão: no Vale do Silício, as pessoas almoçavam juntos. Com isso, o capital social, a rede, era muito mais forte e ocorriam muito mais interações do que um conglomerado de instituições hierarquizadas, no qual os caminhos para inovação eram poucos.

Para animar uma rede, é preciso encontrar a rede mãe, que pode ser um grupo de amigos, família, vizinhos, ONGs entre outros, e estimular a comunicação entre as pessoas, de forma viral, P2P, mais forte do que o broadcast, em que uma pessoa conversa com muitas reduzindo a confiança. Por meio das conversas, cria-se uma rede voluntária com um objetivo e, com uma agenda compartilhada entre todos, inicia-se o crowdsourcing, no qual as pessoas se mobilizam espontaneamente para realizar suas ações e contribuir com o objetivo da rede.

A Ciência das Redes ainda é recente. Mais informações sobre ela podem ser encontradas aqui. As redes são um novo modelo organizacional, muito competitivo, que têm potencial de mudar o formato da cadeia produtiva, valorizando o talendo e a inteligência das pessoas em tomarem decisões. No entanto, sua abordagem tem maior impacto na geração de idéias e na inovação, que comprovadamente ocorre com mais frequência em ambientes que valorizam as pessoas e suas idéias e permitem trocas de experiências de forma natural e espontânea. Há vários casos de sucesso fantásticos envolvendo a cooperação em redes. Conseguir adotar um modelo para nossas organizações pode ser um passo vital para a excelência e o sucesso a longo prazo.

Um comentário:

  1. Gostei muito do seu texto Seiji. Sou médico e trabalho com montagem e monitoramento de redes de saúde em nível público. Sou mestre em saúde comunitária e tento agora elaborar um ante-projeto para o mestrado de administração. Interessa-me investigar qual o grau de descentralização seguro para predizer utilização sustentável da assistência suplementar em saúde. Obrigado pelas dicas no seu texto. Forte abraço. Sérgio Bastos - sergioborgesbastos@gmail.com

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